segunda-feira, 25 de maio de 2009

Conteúdo Essencial de Direitos Fundamentais - Teorias Subjetiva e Objetiva


Já num posicionamento que corresponde aos acontecimentos histórico-doutrinários, é possível, portanto, classificar as teorias sobre o núcleo essencial em subjetiva e objetiva.
Para melhor esclarecer, lança-se a pergunta elaborada pelo professor Canotilho: Qual o objecto da protecção: o direito subjectivo individual ou a garantia objectiva? Qual o valor da protecção: o núcleo essencial é um valor absoluto ou depende da sua confrontação com outros direitos ou bens?[1]
Pois bem, sobre os critérios utilizados para determinar o conteúdo essencial não existe consenso. A discussão gira em torno de se deve ser estabelecido segundo uma norma objetiva ou um direito subjetivo.
O primeiro critério exige a consideração global do problema, visto que os artigos que contêm os direitos fundamentais são parte de todo o ordenamento jurídico. Assim, admite-se que um direito fundamental possa não ser aplicado a um particular, sem que isso afete o conteúdo essencial, mas sempre que continue vigente para as demais pessoas. Partindo da lição dada pelo professor Vieira de Andrade, é possível entender que o núcleo mínimo dos direitos fundamentais se refere ao «complexo jurídico-normativo na sua essência» e não à realidade social em si. É com esse alcance que vinculam o Estado, admitindo um espaço maior ou menor, de liberdade de conformação, mas lhe sendo vedado sempre a destruição, bem como a descaracterização ou a desfiguração do instituto (do seu núcleo essencial).[2] Segundo Friedrich Klein, uma interpretação objetiva implica que a validade de uma disposição de direito fundamental seja de tal forma reduzida que se torne insignificante para todos os indivíduos ou para a maior parte deles ou ainda para a vida social.[3]
Em oposição, quando é considerada a teoria subjetiva, é necessário examinar a gravidade da limitação do direito em relação ao indivíduo afetado, pois é ele, e não a coletividade, o sujeito desse direito fundamental.[4] Alexy, ao comentar o dispositivo da Lei Fundamental alemã, afirma que “se a Constituição (alemã) estabelece algo tão importante quanto uma proibição de afetação do conteúdo essencial dos direito fundamentais, então, isso diz respeito no mínimo também a posições de direitos fundamentais individuais.”[5] Segundo ele, a natureza dos direitos fundamentais como direitos dos indivíduos milita, no mínimo, a favor de uma coexistência de uma teoria subjetiva e de uma teoria objetiva.[6]
Um núcleo essencial estritamente jurídico (objetivo) só preserva a existência do próprio instituto jurídico, enquanto um núcleo essencial sócio-cultural pressupõe uma realização efetiva e teleológica do mínimo que se pretende resguardar. E cada vez mais se é levado a crer que a idéia de núcleo essencial é menos imutável, menos universal; e mais contingente, social, histórica, assumindo uma feição cada vez mais cultural. É certo que o mínimo será universal naquilo que a humanidade tem de universal. Mas será cultural quando leva em conta as características de cada Estado, Povo, Sociedade, onde se faz imprescindível a análise pelo juiz. O tanto que se quis fugir da idéia de relegar a solução da problemática à análise do caso concreto não foi suficiente para deixar de reconhecer a importância da figura do Juiz na apreciação do mínimo essencial.
Mas a concepção do direito como um fenômeno cultural, impõe uma análise de outros fatores que transbordam à esfera estritamente jurídica e que não se nega uma dimensão constitutiva da historicidade e tempo, como sugerira Martin Heidegger, tendo uma intencionalidade marcadamente antropológico-histórica, compreendendo a juridicidade como um «projeto histórico-social do homem», agora não mais a priori, absoluto ou indisponível, mas resultado de uma dialética entre pressupostas condições humano-sociais.[7]
[1] CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7.ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 459
[2] ANDRADE, José Carlos Vieira de, Os direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 3.ed. Coimbra: Almedina, 2004. P. 145.
[3] Hermann v. Mangoldt/ Friedrich Klein, Das Bonner Grundgesetz, v.1, art. 19, Anm. V 2a. apud ALEXY, Robert. Theory der Grundrechte. 5.ed. trad. VIRGILIO AFONSO DA SILVA. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros,2008. p. 297
[4] LOPES, Ana Maria D’Ávila. A garantia do conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Revista de Informação Legislativa. Brasília a. 41 n. 164 out./dez. 2004
[5] ALEXY, Robert. Theory der Grundrechte. 5.ed. trad. VIRGILIO AFONSO DA SILVA. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros,2008. p. 297
[6] ALEXY, Robert. Theory der Grundrechte. 5.ed. trad. VIRGILIO AFONSO DA SILVA. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros,2008. p. 297
[7] CASTANHEIRA NEVES, A. A crise actual da Filosofia do Direito no contexto da crise global da filosofia. Tópicos para a possibilidade de uma reflexiva reabilitação. Coimbra: Coimbra Editora, 2003.p. 40.

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